Soluções para atenuar os contrastes

Soluções para atenuar os contrastes

 

i

A cooperação internacional na ajuda ao desenvolvimento (Pág. 73-95)

Tipos de ajuda ao desenvolvimento

Insucessos da ajuda ao desenvolvimento

O papel da ONU na ajuda ao desenvolvimento

Agenda de desenvolvimento

Objetivos de Desenvolvimento Sustentável

O papel das ONG na ajuda ao desenvolvimento

Retrato síntese da Ajuda Pública ao Desenvolvimento portuguesa

Após a II Guerra Mundial, o agravamento das situações de pobreza e de miséria humana, nomeadamente em alguns países descolonizados, tornaram a questão do bem estar económico e social uma preocupação universal. Em 1945 fora criada a Organização das Nações Unidas (ONU) (atualmente com 193 estados membros e dois observadores) com o intuito de promover a cooperação internacional e evitar um novo conflito. Em 1965 foi criado o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) com o objetivo de unificar e alargar as operações de ajuda ao desenvolvimento. Atualmente está presente atualmente em 166 países do mundo onde colabora com os diversos governos, com a iniciativa privada ou com a sociedade civil. Alguns dos seus objetivos passam por manter a segurança e a paz mundial, promover os direitos humanos, auxiliar no desenvolvimento económico e no progresso social e cultural, proteger o meio ambiente e prover ajuda humanitária em casos de fome, desastres naturais ou conflitos armados, sem distinção de raça, género, língua ou religião. Nas décadas de 1960 e 1970, a ajuda incidia especialmente nos países asiáticos. Atualmente é o continente africano que recebe a maior parte da ajuda, já que apresenta as maiores carências a nível político, económico e social.

Tipos de ajuda ao desenvolvimento:

 

Com o intuito de ultrapassar os obstáculos que se colocam ao desenvolvimento de muitos países e atenuar os contrastes existentes, torna-se premente uma cooperação internacional entre Países Desenvolvidos (PD) e os Países Em Desenvolvimento (PED), com o intuito de combater as dificuldades económicas e sociais de forma duradora e sustentável.

A cooperação internacional pode assumir várias vertentes, contudo, neste contexto, a mais comum é a ajuda ao desenvolvimento, que pode consistir: na transferência de dinheiro (donativos e empréstimos); na implementação de programas e projetos, através do apoio técnico (construção de infraestruturas como barragens ou saneamento); no fornecimento de bens e serviços; ou no alívio das dívidas externas.

Existem dois tipos de ajuda ao desenvolvimento, a ajuda pública e a ajuda privada, que podem sem resumidos num esquema síntese (Figura 1).

Síntese dos principais tipos de ajuda ao desenvolvimento.
i

Figura 1: Síntese dos principais tipos de ajuda ao desenvolvimento.

A dinamização da ajuda ao desenvolvimento torna-se, assim, essencial para equilibrar o desenvolvimento dos diferentes países. Segundo a sua origem esta ajuda pode ser classificada como ajuda pública e ajuda privada; segundo os seus canais de execução esta pode ser classificada como bilateral (fornecida diretamente de um país doador a um país recetor) ou multilateral (a ajuda doada pelos países é canalizada para organizações que por sua vez a distribuem pelos países recetores); segundo os seus instrumentos de aplicação esta pode ser classificada como ajuda alimentar (doação de bens alimentares), ajuda humanitária (ajuda prestada às populações pobres, durante um longo período de tempo, com vista a garantir as necessidades básicas), ajuda de emergência (ajuda humanitária prestada durante um curto período de tempo, em situações de catástrofe natural ou de guerra), cooperação técnica (envio e/ou formação de pessoal especializado como engenheiros, médicos ou professores) ou cooperação financeira (doação e/ou empréstimo de dinheiro). Os diversos acordos internacionais definem que os países doadores devem ser responsáveis por contribuir com 0,7% do seu Rendimento Nacional Bruto (RNB) para a ajuda ao desenvolvimento. Todavia, apesar de alguns países estão bastante acima deste valor, a maioria não cumpre a meta estabelecida, como é o caso de Portugal.

Entre os países doadores destacam-se os países mais desenvolvidos mas também instituições e/ou organizações. Por vezes, o mesmo país contribui com Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD) de forma bilateral, mas também multilateral se pertencer a alguma organização como a ONU ou Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE). A maior parte da APD provém de organizações internacionais como a ONU, o Banco Mundial ou a OCDE. Salienta-se, ainda, que a União Europeia (UE), juntamente com alguns países como os EUA ou o Japão, são responsáveis por uma parte muito substancial da APD mundial.

A repartição/distribuição destas ajudas, a nível mundial, apresenta grandes desigualdades (Quadro 1).

Quadro 1: Principais regiões recetoras de APD em 2017 (US $ (milhões))
1 África Subsariana 26 297
2 África Central e Meridional 13 755
3 Oceânia 11 014
4 Médio Oriente e Norte de África 13 713
5 América Latina e Caraíbas 8 150
6 Europa 4 058
Fonte dos dados: Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico

 

 
 

Também ao nível dos países os contrastes são bastante significativos (Quadro 2).

Quadro 2: Principais países recetores de APD em 2017 (US $ (milhões))
1 Índia 3 516
2 Afeganistão 3 024
3 Síria 2 524
4 Vietename 2 308
5 Etiópia 2 172
6 Iraque 2 102
7 Jordânia 2 005
8 Indonésia 1 973
9 Bangladesh 1 874
10 Paquistão 1 765
Fonte dos dados: Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico

Quando os países doadores e os países recetores cumprem as responsabilidades que assumiram, as ajudas ao desenvolvimento traduzem-se em benefícios para as populações (Figura 2). Para isso é essencial que os países se empenhem de forma decisiva no seu próprio desenvolvimento, eliminando a corrupção, a má governação e os programas de auxílio mal direcionados.

Exemplo de sucesso da ajuda ao desenvolvimento no Gana.
i

Figura 2: Exemplo de sucesso da ajuda ao desenvolvimento no Gana.

Insucessos da ajuda ao desenvolvimento:

Algumas ajudas não surtem efeitos positivos. Regra geral, o ritmo de mudança tem sido mais lento nos Países Menos Avançados (PMA), especialmente nos países sem litoral, ou seja sem faixa costeira, ou distantes dos mercados mundiais.

Embora os PD tenham o dever de ajudar os PED, muitas vezes, a motivação para esta cooperação internacional através da ajuda ao desenvolvimento pode ter diversos motivos. De uma forma oficial, os países doadores explicam as suas razões com base no altruísmo (inclinação para procurarmos obter o bem para o próximo) e na moral (conjunto dos princípios e valores de conduta do homem), porém escondem, muitas vezes, interesses económicos e comerciais, como o acesso a recursos naturais, a matérias primas e mercados nas ex-colónias.

 

Deste modo, em 2014, a Organização Não Governamental (ONG) Global Justice Now apresentou o estudo Honest Accounts? The true story of Africa’s billion dollar loses onde debate e reflete quem ganha realmente com a APD, apontando críticas ao verdadeiro beneficio das ajudas visto que muitas dessas ajudas acabam por ser, muitas vezes, mal canalizadas ou existem interesses camuflados (Figura 3).

O que perde África: Traduzido e adaptado de Honest Accounts? The true story of Africa’s billion dollar loses.
i

Figura 3: O que perde África: Traduzido e adaptado de Honest Accounts? The true story of Africa’s billion dollar loses.

Assim, as principais causas do insucesso das ajudas ao desenvolvimento tanto podem ser por culpa dos países doadores como dos países recetores (ou de ambos) (Figura 4).

Principais causas do insucesso das ajudas ao desenvolvimento.
i

Figura 4: Principais causas do insucesso das ajudas ao desenvolvimento.

O papel da ONU na ajuda ao desenvolvimento:

 

A ONU é uma instituição internacional fundada em 1945, por 51 países. Uma vez que foi fundada no pós II Guerra Mundial, o principal objetivo da ONU residiu na manutenção da paz mundial. Atualmente tem objetivos e áreas de intervenção muito mais alargados. Deste modo, os objetivos fundamentais da ONU são:

- Manter a paz e segurança no mundo;

- Fomentar as relações de amizade entre todos os países;

- Ajudar os países a trabalharem em conjunto para a resolução de problemas económicos, sociais, culturais ou humanitários (melhorar a vida das pessoas mais pobres; eliminar a fome ou a doença; combater o analfabetismo; encorajar o respeito pelos direitos e liberdades individuais);

- Ser um centro destinado a harmonizar (conciliar) os esforços das nações para alcançar esses objetivos comuns.

Através dos seus múltiplos organismos e agências especializadas (Figura 8), a ONU estabelece ações importantes a nível mundial, obtendo resultados significativos em todas as áreas (Figura 5).

Alguns dos organismos das Nações Unidas.
i

Figura 5: Alguns dos organismos das Nações Unidas.

A ONU tenta assumir uma posição neutra, mas focada nos países mais desfavorecidos, tendo em vista o equilíbrio mundial. Todavia, acordar os pontos de vista e interesse de quase todos os países do mundo torna muito complexa a sua ação, impedindo, muitas vezes, a obtenção de sucesso ou a adoção de algumas medidas. Assim, por vezes, surgem críticas tais como a dificuldade em passar das palavras à ação; alguma passividade em relação aos países mais poderosos e a sua falta de eficácia dado que existe, por vezes, desproporção entre os meios investidos e os resultados alcançados.

Agenda de desenvolvimento:

 

Tendo em vista a uniformização dos níveis de desenvolvimento mundiais, no início do presente milénio (ano 2000), os estados membros da ONU assumiram o compromisso de ajudar os países menos desenvolvidos a alcançarem um melhor nível de vida. Para tal estabeleceram os Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) com metas e prazos bem definidos. Estes constituíram um verdadeiro esforço de cooperação internacional e um marco nos esforços globais e nacionais de desenvolvimento, tendo em vista a sua persecução num prazo de quinze anos (2000-2015). A sua concretização passou pelo estabelecimento de oito grandes objetivos, subdivididos em 18 metas e 48 indicadores (Figura 6).

Objetivos de Desenvolvimento do Milénio.
i

Figura 6: Objetivos de Desenvolvimento do Milénio.

No entanto, fruto das disparidades mundiais de desenvolvimento, apenas foram alcançadas algumas metas. As dificuldades na concretização dos ODM tiveram por base múltiplas fraquezas, entre elas a falta de vontade política de todos os intervenientes pois nem todas as promessas realizadas foram cumpridas, nomeadamente a contribuição de 0,7% do RNB para a ajuda ao desenvolvimento.

Objetivos de Desenvolvimento Sustentável:

 

 

Com a conclusão dos ODM, os líderes mundiais empenharam-se em renovar compromissos políticos que permitam ultrapassar as carências e os obstáculos ao desenvolvimento humano que ainda hoje se colocam, criando novos objetivos.

A Agenda 2030 é uma agenda alargada e ambiciosa que aborda várias dimensões do desenvolvimento sustentável (sócio, económico, ambiental) e que promove a paz, a justiça e instituições eficazes. Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) têm como base os progressos e lições aprendidas com os 8 objetivos estabelecidos entre 2000 e 2015, e são fruto do trabalho conjunto de governos e cidadãos de todo o mundo. A Agenda 2030 e os 17 objetivos estabelecidos são a visão comum para a Humanidade, um contrato entre os líderes mundiais e os povos e “uma lista das coisas a fazer em nome dos povos e do planeta”.

OBJETIVO 1

Erradicar a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares

OBJETIVO 2

Erradicar a fome, alcançar a segurança alimentar, melhorar a nutrição e promover a agricultura sustentável

OBJETIVO 3

Garantir o acesso à saúde de qualidade e promover o bem-estar para todos, em todas as idades

OBJETIVO 4

Garantir o acesso à educação inclusiva, de qualidade e equitativa, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos

OBJETIVO 5

Alcançar a igualdade de género e empoderar todas as mulheres e raparigas

OBJETIVO 6

Garantir a disponibilidade e a gestão sustentável da água potável e do saneamento para todos

OBJETIVO 7

Garantir o acesso a fontes de energia fiáveis, sustentáveis e modernas para todos

OBJETIVO 8

Promover o crescimento económico inclusivo e sustentável, o emprego pleno e produtivo e o trabalho digno para todos

OBJETIVO 9

Construir infra-estruturas resilientes, promover a industrialização inclusiva e sustentável e fomentar a inovação

OBJETIVO 10

Reduzir as desigualdades no interior dos países e entre países

OBJETIVO 11

Tornar as cidades e comunidades inclusivas, seguras, resilientes e sustentáveis

OBJETIVO 12

Garantir padrões de consumo e de produção sustentáveis

OBJETIVO 13

Adotar medidas urgentes para combater as alterações climáticas e os seus impactos

OBJETIVO 14

Conservar e usar de forma sustentável os oceanos, mares e recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável

OBJETIVO 15

Proteger, restaurar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, travar e reverter a degradação dos solos e travar a perda de biodiversidade

OBJETIVO 16

Promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas a todos os níveis

OBJETIVO 17

Reforçar os meios de implementação e revitalizar a parceria global para o desenvolvimento sustentável

O papel das ONG na ajuda ao desenvolvimento:

 

 

 

Também a sociedade civil se organiza no sentido de participar na resolução de problemas que afetam as populações, muitas vezes sem resposta eficaz por parte dos governos, criando Organizações Não Governamentais (ONG). Como não têm fins lucrativos, obtêm financiamento através de donativos particulares (cidadãos ou empresas), mas podem, também, ser apoiadas por entidades estatais, e recorrem, frequentemente, a voluntários.

As ONG a nível mundial são muito numerosas e apresentam dimensões muito diversas. Estas desempenham um papel muito importante na informação global do público em geral e na cooperação para o desenvolvimento das regiões mais carenciadas e pobres do planeta. Executam, por exemplo, ações de cariz humanitário ou ambiental em situações de conflito, de paz, de catástrofes, de assistência na saúde, de educação, ou de preservação ambiental.

Muitas ONG estão voltadas para o desenvolvimento, nomeadamente no combate à pobreza em geral, tomando assim o nome de Organizações Não Governamentais para o Desenvolvimento (ONGD). Estas desenvolvem ações nos países em desenvolvimento nos domínios da ajuda humanitária de emergência, da proteção e promoção dos direitos humanos e, principalmente, da cooperação para o desenvolvimento.

Retrato síntese da Ajuda Pública ao Desenvolvimento portuguesa:

 

A Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD) portuguesa tem estado muito aquém do que ficou estabelecido nos acordos internacionais, ou seja, abaixo do compromisso de doar 0,7% do RNB. Após um período de tendência positiva entre 2010 e 2011, iniciou, a partir de 2012, um ciclo decrescente. Justificou este comportamento o facto de Portugal se encontrar, até junho de 2014, sob um Programa de Assistência Económica e Financeira[Economia; Política] O PAEF foi acordado, em maio de 2011, entre as autoridades portuguesas, a UE e o FMI. O pacote de assistência financeira previa, para o período de 2011 a 2014, um total de 78 mil milhões de euros, que visavam o restabelecimento da confiança dos mercados financeiros internacionais e a promoção da competitividade e do crescimento económico sustentável, assentando em três pilares: consolidação orçamental, estabilidade do sistema financeiro e transformação estrutural da economia portuguesa. No âmbito do PAEF tiveram lugar doze missões de revisão e no total foram recebidos onze desembolsos, representando cerca de 97% do montante total acordado. O programa expirou a 30 de junho de 2014, sem o desembolso da última tranche prevista. (PAEF). Em 2015, a tendência negativa ainda se manteve, representando uma diminuição global face a 2014 de 14%, situando-se, em valores líquidos, nos 279 milhões de euros. A recuperação ocorreu em 2016, assinalando-se uma subida de 11% face ao ano anterior, o que correspondeu a uma APD total de 310 milhões de euros, coincidindo com uma fase de recuperação do crescimento económico em Portugal. Em 2017, a tendência crescente veio confirmar-se tendo a APD alcançado 338 milhões de euros (Figura 7).

Evolução da APD portuguesa.
i

Figura 7: Evolução da APD portuguesa.

O peso da APD portuguesa no RNB (rácio APD/RNB) em 2018 situou-se nos 0,17%, o que representou uma ligeira subida face a 2015, 2016 e 2017. A quebra do rácio nos anos precedentes refletiu os efeitos do programa de ajustamento económico e financeiro a que Portugal esteve sujeito. A tendência ligeiramente crescente nos últimos anos revela um esforço adicional positivo da APD portuguesa.

A APD Bilateral portuguesa representa, em média para o período 2013-2017, 47% da APD total, confirmando a concentração geográfica nos Países de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) e em Timor-Leste, enquanto a APD Multilateral atingiu um peso relativo de 53%, sendo maioritariamente dirigida para as instituições da UE, Grupo Banco Mundial e da ONU.

 

Referências